MISSA DOS QUILOMBOS
Texto: Pedro CASALDÁLIGA e Pedro TIERRA
Música: Milton NASCIMENTO

Disco longplay: Philips
Cassete: Ariola, São Paulo 1982.
Compact Disc Digital Audio: PolyGram do Brasil Ltda.

 

   
 

Apresentação

Em nome de um deus supostamente branco e colonizador, que nações cristãs tem adorado como se fosse o Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, milhões de Negros vem sendo submetidos, durante séculos, à escravidão, ao desespero e à morte. No Brasil, na América, na Africa mãe, no Mundo.

Deportados, como "peças", da ancestral Aruanda, encheram de mão de obra barata os canaviais e as minas e encheram as senzalas de indivíduos desaculturados, clandestinos, inviáveis. (Enchem ainda de sub-gente -para os brancos senhores e as brancas madames e a lei dos brancos- as cozinhas, os cais, os bordéis, as favelas, as baixadas, os xadrezes).

Mas um dia, uma noite, surgiram os Quilombos, e entre todos eles, o Sinaí Negro de Palmares, e nasceu, de Palmares, o Moisés Negro, Zumbi. E a liberdade impossível e a identidade proibida floresceram, "em nome do Deus de todos os nomes", "que fez toda carne, a preta e a branca, vermelhas no sangue".
Vindos "do fundo da terra", "da carne do açoite", "do exilio da vida", os Negros resolveram forçar "os novos Albores" e reconquistar Palmares e voltar a Aruanda.

E estão aí, de pé, quebrando muitos grilhões -em casa, na rua, no trabalho, na igreja, fulgurantemente negros ao sol da Luta e da Esperança.
Para escândalo de muitos fariseus e para alivio de muitos arrependidos, a Missa dos Quilombos confessa, diante de Deus e da História, esta máxima culpa cristã.
Na música do negro mineiro Milton e de seus cantores e tocadores, oferece ao único Senhor "o trabalho, as lutas, o martirio do Povo Negro de todos os tempos e de todos os lugares".

E garante ao Povo Negro a Paz conquistada da Libertação. Pelos rios de sangue negro, derramado no mundo. Pelo sangue do Homem "sem figura humana", sacrificado pelos poderes do Império e do Templo, mas ressuscitado da Ignomínia e da Morte pelo Espírito de Deus, seu Pai.
Como toda verdadeira Missa, a Missa dos Quilombos é pascal: celebra a Morte e a Ressurreição do Povo Negro, na Morte e Ressurreição do Cristo.

Pedro Tierra e eu, já emprestamos nossa palavra, iradamente fraterna, à Causa dos Povos Indígenas, com a "Missa da Terra sem males", emprestamos agora a mesma palavra à Causa do Povo Negro, com esta Missa dos Quilombos.

Está na hora de cantar o Quilombo que vem vindo: está na hora de celebrar a Missa dos Quilombos, em rebelde esperança, com todos "os Negros da Africa, os Afros da América, os Negros do Mundo, na Aliança com todos os Pobres da Terra".

Pedro Casaldáliga


I.- A DE Ó (ESTAMOS CHEGANDO). ABERTURA

(Coro–Cantado)

Estamos chegando do fundo da terra,
estamos chegando do ventre da noite,
da carne do açoite nós somos,
viemos lembrar.

Estamos chegando da morte nos mares,
estamos chegando dos turvos poroes,
herdeiros do banzo nós somos,
viemos chorar.

Estamos chegando dos pretos rosários,
estamos chegando dos nossos terreiros,
dos santos malditos nós somos,
viemos rezar.

Estamos chegando do chao da oficina,
estamos chegando do som e das formas,
da arte negada que somos
viemos criar.

Estamos chegando do fundo do medo,
estamos chegando das surdas correntes,
um longo lamento nós somos,
viemos louvar.

A de Ó (Recitado)

-Do Exílio da vida,
das Minas da Noite,
da carne vendida,
da Lei do açoite,
do Banzo dos mares...
aos novos Albores!
vamos a Palmares
todos os tambores!!!

Estamos chegando dos ricos fogões,
estamos chegando dos pobres bordéis,
da carne vendida nós somos,
viemos amar.

Estamos chegando das velhas senzalas,
estamos chegando das novas favelas,
das margens do mundo nós somos,
viemos dançar.

Estamos chegando dos trens dos suburbios,
estamos chegando nos loucos pingentes,
com a vida entre os dentes chegamos,
viemos cantar.

Estamos chegando dos grandes estádios,
estamos chegando da escola de samba,
sambando a revolta chegamos,
viemos gingar.

A de Ó (Recitado)

Estamos chegando do ventre das Minas,
estamos chegando dos tristes mocambos,
dos gritos calados nós somos,
viemos cobrar.

Estamos chegando da cruz dos engenhos,
estamos sangrando a cruz do Batismo,
marcados a ferro nós fomos,
viemos gritar.

Estamos chegando do alto dos morros,
estamos chegando da lei da Baixada,
das covas sem nome chegamos
viemos clamar.

Estamos chegando do chao dos Quilombos,
estamos chegando do som dos tambores,
dos Novos Palmares só somos,
viemos lutar.

A de Ó (Recitado)



II.- EM NOME DO DEUS

(Solo–Cantado)

Em nome do Deus de todos os nomes
-Javé
Obatalá
Olorum
0ió.

Em nome do Deus, que a todos os Homens
nos faz da ternura e do pó.

Em nome do Pai, que fez toda carne,
a preta e a branca,
vermelhas no sangue.

Em nome do Filho, Jesus nosso irmão,
que nasceu moreno da raça de Abraão.
Em nome do Espírito Santo,
bandeira do canto
do negro folião.

Em nome do Deus verdadeiro
que amou-nos primeiro
sem dividição.

Em nome dos Três
que sao um Deus só,
Aquele que era,
que é,
que será.

Em nome do Povo que espera,
na graça da Fé,
à voz do Xangô,
o Quilombo-Páscoa
que o libertará.

Em nome do Povo sempre deportado
pelas brancas velas no exílio dos mares;
marginalizado
nos cais, nas favelas
e até nos altares.

Em nome do Povo que fez seu Palmares,
que ainda fará Palmares de novo
-Palmares, Palmares, Palmares
do Povo!!!



III.- RITO PENITENCIAL


(Coro - Cantado)

Kyrie eleison, Christe eleison, Kyrie eleison.

Alma não é branca,
luto não é negro,
negro não é folk.

Kyrie eleison.

- Senhor do Bonfim
do bom começar:
não seja a alegria
apenas de um dia;
não seja a folia
para desfilar
na avenida sua.
Que seja, por fim,
a tua Alforria
e nossa a rua,
Senhor do Bonfim!

Kyrie eleison, Christe eleison, Kyrie eleison.

(Recitado)

Da raça maldita
gratuitamente,
a raça de Cam.
Secular estigma
da escrava Agar,
Mãe espoliada,
Ismael dos Povos,
denegrida Africa.

(Coro - Cantado)

Terras de Luanda,
Costa do Marfim,
Reino de Guiné,
Patria de Aruanda
Awa de! (Estamos aqui)

(Recitado)

Carne em toneladas,
fardos de porão.
Quota da Coroa
fichas de Batismo,
marcados a ferro
para a Salvação.
Entregues à Morte,
sendo Cristo a vida.
Humanos leilões,
pecas de cobiça,

300 milhões
de africanos mortos
na Segregação
Caça das Bandeiras,
do Esquadrão da Morte.
Exus do destino,
capitães-do-mato.
Quantos Jorge Velho
de todos os Lucros,
de todos os Tempos,
de todas as Guardas!
Quantas Aureas Leis
da Justiça Branca!

(Coro– Cantado)

Queimamos, de medo
-do medo da História-
os nossos arquivos.
Pusemos em branco
a nossa memória.

(Recitado)

Cultura à margem,
Culto condenado,
Fé de freguesia,
Giro tolerado,
Revolta ignorada,
História mentida.

Ressaca dos Portos.
Harlem dos Impérios,
Apartheid em casa,
favela do mundo.
Com "direito a enterro"
sem direito à vida.
Pelourinhos brancos,
flagelados pretos.
Negro sem emprego,
sem voz e sem vez.
Sem direito a ser,
a ser e a ser Negro.
Dobrados nos eitos,
os peitos quebrados,
os peitos sugados
por filhos alheios,
senhores ingratos.
Bebês imolados
pelas Anas Paes,
Testas humilhadas
nas águas dos cais,

Bronze incandescente
nas bocas dos fornos.
Peões de fazenda,
pé de bóia-fria,
artista varrido
no pó da oficina,
garçom de boteco,
sombra de cozinha,
mão de subemprego,
carne de bordel...
Pixotes nas ruas,
caçados nos morros,
mortos no xadrez!

Negro embranquecido
pra sobreviver.
(Branco enegrecido
para gozação).
Negro embranquecido,
morto mansamente
pela integração.

(Coro - Cantado)

Mulato iludido,
fica do teu lado,
do lado do Negro.
Não faças, Mulato,
a branca traição.

(Recitado)

Padres estudados,
Pastores ouvidos,
Freiras ajeitadas,
Doutores da sorte,
Cantores de turno,
Monarcas de estádio...
Não negueis o Sangue,
o grito dos Mortos,
o cheiro do Negro,
o aroma da Raça,
a força do Povo,
a voz de Aruanda,
a volta aos QUILOMBOS!

(Coro- Cantado)

- Bom Jesus de Pirapora,
na procura desta hora,
tem piedade de nós.

- Kyrie eleison!

(Solo - Cantado)

Senhor Morto,
Deus da Vida,
nesta luta proibida,
tem piedade de nós.

(Coro)

- Christe eleison!

(Solo - Cantado)

- Irmão Mor da Irmandade,
na Paixão da Liberdade,
tem piedade de nós.

(Coro)

Kyrie eleison!


IV.- ALELUIA

(Coro–Cantado)

Aleluiá, aleluiá, aleluiá!

Fala, Jesus, Palavra de Deus:
Tu tens a palavra!

Aleluiá...

Irmão que fala a Verdade aos Irmãos,
dá-nos tua nova Libertação.
Quilombolas livres do lucro e do medo,
nós viveremos o teu Evangelho,
nós gritaremos o teu Evangelho!

Aleluiá...
Nenhum poder
nos calará.
Aleluiá, aleluiá, aleluiá!

Contra tantos mandatos do Odio,
Tu nos trazes a Lei do Amor.
Frente a tanta Mentira
Tu és a Verdade, Senhor.

Entre tanta notícia de Morte,
Tu tens a Palavra da Vida.
Sob tanta promessa fingida,
sobre tanta esperanca frustrada,
Tu tens, Senhor Jesus,
a última palavra.
E nós apostamos em Ti!!!

Aleluiá.
A Tua Verdade nos libertará.
Aleluiá...



V.- OFERTÓRIO


(Recitado)

Na cuia das mãos
trazemos o vinho e o pão,
a luta e a fé dos irmãos,
que o Corpo e o Sangue do Cristo serão.

(Recitado)

O ouro do Milho
e não o dos Templos,
o sangue da Cana
e não dos Engenhos,
o pranto do Vinho
no sangue dos Negros,
o Pão da Partilha
dos Pobres Libertos.

(Recitado)

Trazemos no corpo
o mel do suor,
trazemos nos olhos
a dança da vida,
trazemos na luta,
a Morte vencida.
No peito marcado
trazemos o Amor.
Na Páscoa do Filho,
a Páscoa dos filhos
recebe, Senhor.

(Coro-Cantado)

Trazemos nos olhos,
as águas dos rios,
o brilho dos peixes,
a sombra da mata,
o orvalho da noite,
o espanto da caça,
a dança dos ventos,
a lua de prata,
trazemos nos olhos
o mundo, Senhor!

(Recitado)

–Na palma das mâos trazemos o milho,
a cana cortada, o branco algodão,
o fumo-resgate, a pinga-refúgio,
da carne da terra moldamos os potes
que guardam a água, a flor de alecrim,
no cheiro de incenso, erguemos o fruto
do nosso trabalho, Senhor! Olorum!

(Coro-Cantado)

O som do atabaque
marcando a cadência
dos negros batuques
nas noites imensas
da Africa negra,
da negra Bahia,
das Minas Gerais,
os surdos lamentos,
calados tormentos,
acolhe Olorum!

(Recitado)

-Com a força dos bracos lavramos a terra
cortamos a cana, amarga doçura
na mesa dos brancos.

- Com a força dos braços cavamos a terra,
colhemos o ouro que hoje recobre
a igreja dos brancos.

-Com a força dos braços plantamos na terra,
o negro café, perene alimento
do lucro dos brancos.

-Com a força dos braços, o grito entre os dentes,
a alma em pedaços, erguemos impérios,
fizemos a América dos filhos dos brancos!

(Coro–Cantado)

A brasa dos ferros lavrou-nos na pele,
lavrou-nos na alma, caminhos de cruz.
Recusa Olorum o grito, as correntes
e a voz do feitor, recebe o lamento,
acolhe a revolta dos negros, Senhor!

(Recitado)

-Trazemos no peito
os santos rosários,
rosários de penas,
rosários de fé
na vida liberta,
na paz dos quilombos
de negros e brancos
vermelhos no sangue.
A Nova Aruanda
dos filhos do Povo
acolhe, Olorum!

(Recitado)

Recebe, Senhor
a cabeça cortada
do Negro Zumbi,
guerreiro do Povo,
irmão dos rebeldes
nascidos aqui,
do fundo das veias,
do fundo da raça,
o pranto dos negros,
acolhe Senhor!

(Coro-Cantado)

Os pés tolerados na roda de samba,
o corpo domado nos ternos do congo,
inventam na sombra a nova cadência,
rompendo cadeias, forçando caminhos,
ensaiam libertos a marcha do Povo,
a festa dos negros, acolhe Olorum!


VI.- O SENHOR É SANTO

(Coro-Cantado)

O Senhor é Santo, o Senhor é Santo, o Senhor é Santo.

O Senhor é o só Senhor.
Todos nós somos iguais.
Oxalá o Reino do Pai
seja sempre o nosso Reino.

O Senhor é Santo...

O Reino nos vem
em Cristo Rei Salvador.
O Reino se fez
no Povo Libertador.

Hosana, Hosana, Hosana.


VII.- RITO DA PAZ

(Coro - Cantado)

Saravá, A-i-é, Abá.

A Paz d'Aquele, que é
nossa Paz!
A Paz, que o Povo fará!

Saravá, A-i-é, Aba!

A louca Esperança
de ver todo irmão
caindo na dança da vida,
cantando vencida
toda Escravidão!
Vai ser abolida
a paz da Abolição
que agora temos.
E contra a paz cedida,
a Paz conquistada teremos!!!

Saravá,
do novo Quilombo de amanhã.
A-i-é dessa "festa de todos", que virá!

(A maneira de um Pregão)

-Aos treze de maio de mil-oitocentos-e-oitenta-e-oito,
nos deram apenas decreto em palavras.
Mas a Liberdade vamos conquista-la!

(Coro-Cantado)

A-i-é,
a paz d'Aquele,
que é nossa Paz!

Abá,
a Paz que o Povo fará!

Palmares das lutas da Libertação.
Palmeiras da Páscoa da Ressurreição.
Saravá, A-i-é, Abá!!!


VIII.- COMUNHÃO

(Recitado)

Bebendo a divina bebida
do teu Sangue Limpo, Senhor,
lavamos as marcas da vida,
libertos na Lei do Amor.

Comendo a carne vivente
do Teu Corpo morto na Cruz,
vencemos a Morte insolente
na vida mais forte, Jesus.

Nutrindo a luta na Aliança
e a Marcha em teu novo Maná,
queremos firmar a Esperança
da Aruanda que um dia virá.

Ara ware kosi mi fara.

Todos unidos
num mesmo Corpo,
nada no mundo
nos vencerá.
Todos unidos em Cristo Jesus.
Oxalá!

Ara ware kosi mi fara.

(Solo-M)

Partilha diária em mesa de irmãos.
Porque não é livre quem não tem seu pão.

(Solo-F)

-Partilha constante, na festa e na dor.
Porque não é livre quem não sente amor.

(Solo-M)

-Partilha fraterna de bantus iguais.
Porque não é livre quem junta de mais.

(Solo-F)

-Partilha de muitos unidos na fé.
Porque não é livre quem não é o que é.

(Solo-M)

-Partilha arriscada de vir a perder.
Porque não é livre quem teme morrer.

(Solo-F)

-Partilha segura da Libertação,
que o Cristo partilha a Ressurreição.
Ara ware kosi mi fara...




IX.- LADAINHA

(Leitor) -

Unidos à procura dos quilombos da Libertação, celebramos a "memória perigosa" da Páscoa de Jesús, comungando a força do seu Corpo Ressuscitado. Recolhemos na mesma comunhão o trabalho, as lutas, o martírio do Povo Negro de todos os tempos e de todos os lugares. E invocamos sobre a caminhada, a presença amiga dos Santos, das Testemunhas, dos militantes, dos Artistas, e de todos os construtores anônimos da Esperança Negra.

(Coro-Cantado)

Porque está na hora
pedimos o auxílio de todos os santos,
chamamos a força dos mortos na luta
porque está na hora,
o jeito dos mestres da reza e do canto;
porque está na hora,
cantamos malembes pra Nossa Senhora.

(Coro-Cantado)

Caô - Cabê em si - lobá
Todos os santos nos vão ajudar!

(Recitado)

(Voz-M) Zumbi dos Palmares, Patriarca mártir de todos os Quilombos de ontem, de hoje e de amanhã.
(Voz - F) Dragão do Mar, Francisco José do Nascimento, João Cândido que a chibata não dobrou, Pedro Ivo sombra dos Praieiros pernambucanos, Angelim dos Cabanos, madeira da Resistência, Isidoro Mártir e todos os rebeldes do Povo, na Terra e no Mar.
(M) - José do Patrocínio e todos os pregoeiros da Libertação.
(F) - Haussás, Nagas e Alfaiates da Negra Bahia, e todos os Grupos e movimentos Negros que reivindicam o Futuro.
(M) - Arturo Alfonso Schomburg, memória "do Povo sem História", voz libertária do Caribe.
(F) - Lumumba, tambor-tempestade da Africa levantada.
(M)- Chimpa-Vita, Beatriz do Congo, bandeira em chamas das negras-coragem, e todas as mães-pretas arrancadas da pedra morta para as lutas da vida! E todas as Marlys das baixadas desmascarando o rosto dos assassinos, e todas as anônimas heróicas comadres negras, eixo fecundo da Sobrevivência da Raça.
(F)- Negrinho do Pastoreio, anjo dos vaqueiros das reses perdidas e todos os guias negros das causas do Povo.
(M) - Crianças de Soweto e de Atlanta, massacres da prepotência racial, colheita prematura da Juventude Negra.
(F) - Santeiro Aleijadinho, entalhador dos Santos do Povo. Luís José da Cunha, filho dos mocambos brasa viva ardendo na carne dos esquecidos.
(M)–Louis Armstrong e todos os metais e todas as cordas e todos os Negros Spirituals da América Negra.
(F)- Amílcar Cabral, pai educador da Liberdade Africana.
(MJ - James Meredith, paixão matinal e todos os estudantes dos campus e das ruas que marchais abrindo História.
(F) - Solano Trindade e todos os poetas da madeira, da palavra e da alma negra nunca embranquecida.
(M) - Santo Dias, Companheiro, suor e sangue da Periferia, mártir na cruz das Empresas, e todos os retirantes, lavradores, bóias-frias e operários, construtores do Sindicato livre e da Comunidade Fraterna.

(Coro - Cantado) Caô...

(F) - Santos Reis dos presentes da terra e do culto, peregrinos incansáveis à luz da estrela, atrás do Menino.
(M)- Sao Benedito, irmão acolhedor dos pedidos dos Pobres.
(F)- Santo Agostinho, mente e coração da Africa Mãe.
(M)- Sao Martinho de Lima, porteiro solícito da América Negra.
(F)- Santa Efigênia, discípula do Apóstolo e congregadora de virgens.
(M)- Sao Pedro Claver, escravo fraterno dos escravos negros.
(F)- Sao Gonçalo de Amarante, peregrino e evangelizador dos Pobres.
(M)- Sao Cosme e Damião, curadores do povo sofredor.
(F)- Valência Cano, mártir bom pastor do Litoral Negro, Irmão Lourenço de Nossa Senhora, garimpeiro do Evangelho, ermitão da Comunidade, Frei Gregório de José Maria, deportado pare o Amazonas, Padre Canabarro, vigário comprometido no Sul e todos os pastores, romeiros, missionários, ermitães e confrades devotados ao pranto e à Esperança do Povo Negro.
(M)- Santo Onofre, anacoreta da longa solidão.
(F)- Carlos Lwanga e companheiros mártires de Uganda.
(M)-Martim Luther King, pastor na vida e na morte, voz permanente da marcha da Libertação e todos os mártires da Paz perseguida.


(Coro - Cantado) Caô..



X.- LOUVAÇÃO A MARIAMA

(Coro-Cantado)

- Mariama,
Iya, Iya, ô,
Mãe do Bom Senhor!

Maria Mulata,
Maria daquela
colônia favela,
que foi Nazaré.

Morena formosa,
Mater dolorosa,
Sinhá vitoriosa,
Rosário dos pretos mistérios da Fé.

Mãe do Santo, Santa,
Comadre de tantas,
liberta mulhé...

Pobre do Presépio, Forte do Calvário,
Saravá da Páscoa de Ressurreição,
Roseira e corrente do nosso Rosário,
Fiel Companheira da Libertação.

Por teu Ventre Livre, que é o verdadeiro,
pois nos gera livres no Libertador,
acalanta o Povo que estã em cativeiro,
Mucama Senhora e Mãe do Senhor.

Canta sobre o Morro tua Profecia,
que derruba os ricos e os grandes, Maria.

Ergue os submetidos, marca os renegados.
samba na alegria dos pés congregados.

Encoraja os gritos, acende os olhares,
ajunta os escravos em novos Palmares.

Desce novamente às redes da vida
do teu Povo Negro, Negra Aparecida!!!



XI.- MARCHA FINAL (DE BANZO E DE ESPERANÇA)

(Recitado)


-Banzo da Terra que será nossa,
banzo de todos na Liberdade,
banzo da vida que vai ser outra,
banzo do Reino, maior saudade,

saudade em luta do Amanhã,
vontade da Aruanda que um dia virá!
Saudade da Terra e dos Céus,
o banzo do Homem, saudade de Deus.

(Recitado)

- Trancados na Noite, Milênios afora
forçamos agora, as portas do Dia.
Faremos um Povo de igual Rebeldia.
Faremos um Povo de bantus iguais.
Faremos de todos os lares
fraternas senzalas, sem mais.
Faremos a Negra Utopia
do novo PALMARES
na só Casa Grande dos filhos do Pai.

Os Negros da Africa,
os afros da América,
os Negros do Mundo,
na Aliança com todos os Pobres da Terra.

Seremos o Povo dos Povos:
Povo resgatado,
Povo aquilombado,
livre de senhores,
de ninguém escravo,
senhores de nós,
irmãos de senhores,
filhos do Senhor!

(Recitado)

Sendo Negro o Negro,
sendo índio o índio,
sendo cada um
como nos tem feito
a mão de Olorum.

(Recitado)

Seremos Zumbis, construtores
dos novos QUILOMBOS queridos.

Nos muros remidos
da nossa Cidade,
nos Campos, por fim repartidos,
na Igreja do Rei,
de novo do Povo,
seremos a Lei
da nova Irmandade.
Iremos vestidos
das palmas da Vida.
Teremos a cor da Igualdade.
Seremos a exata medida
da humana feliz Dignidade.

Berimbaus da Páscoa marcarão o pé,
o pé quilombola do novo Toré.
Pela Terra inteira
juntos dançaremos
nossa Capoeira.
Seremos bandeira,
seremos foliões.
No Novo Israel plantaremos
as tendas dos filhos do Santo.
Os prantos, os gritos,
unidos num canto
de irmãos corações,
na luta e na festa do ano inteiro.

(Recitado)

- No rosto de todos os homens sinceros,
a marca da tribo de Deus,
o Sangue sinal do Cordeiro.

(Recitado)

E à espera do nosso Quilombo total
-o alto Quilombo dos céus-,
os braços erguidos, os Povos unidos
serão a muralha ao Medo e ao Mal,
serão valhacouto da Aurora desperta
nos olhos do Povo,
da Terra liberta
no QUILOMBO NOVO!!!